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Abuso ou estupro na infância: é possível denunciar depois de adulto?



Sofrer com abusos sexuais na infância ou mesmo com um estupro nessa fase da vida, em grande parte dos casos, é sinônimo de conviver com essa lembrança dolorosa em silêncio. Isso porque é comum que a criança não procure por ajuda, com medo de ameaças, com vergonha, ou mesmo pela inocência de não entender pelo que está passando. Outro agravante é quando a vítima se abre sobre o ocorrido, mas sofre com a desconfiança de parentes, que fecham os olhos às agressões sofridas. Nesses casos, será que é possível fazer uma denúncia anos após o acontecido? Será que depois de adulta, caso queira, a vítima pode prestar queixa? E o agressor, poderá ser preso?


Essas dúvidas são compartilhadas por vítimas que têm relatado suas histórias ao Bolsa de Mulher - assim como a menina que foi estuprada pelo pai dos 10 aos 15 anos e hoje, aos 31, quer denunciar o homem que a atacou por tanto tempo. Para tentar esclarecer alguns pontos importantes da legislação brasileira, conversamos com o advogado criminalista Gabriel Huberman Tyles, que explica como é possível agir.

Dá para denunciar um abuso sofrido na infância?

Segundo o especialista, o código penal brasileiro permite sim que o caso seja denunciado alguns anos após o ocorrido. Porém, tudo vai depender de quanto tempo se passou. Isso porque há um prazo para que o crime prescreva e deixe de valer alguma punição.

Em quanto tempo o crime prescreve?

Vai depender de qual foi o crime cometido e qual seria a pena aplicada a ele. Tyles explica que, se o crime tiver pena prevista superior a 12 anos, ele prescreve em 20 anos. Isso vale para o caso de estupro de vulnerável (menor de 14 anos), cuja pena é de 15 anos. Ou seja, se esse for o crime, a vítima tem até 20 anos para denunciar seu agressor. Porém, isso varia de acordo com cada caso – existe a possibilidade de prescrever em 16, 12, 8, 4 ou 3 anos.
“É como se fosse uma tabela, que o código penal prevê”, explica o advogado, que exemplifica os tipos de pena e prazos de prescrição dos crimes. Veja abaixo todas as possibilidades de tempo de prescrição.
  • Caso a pena máxima prevista para o crime seja superior a 12 anos, o crime prescreve em 20 anos.
  • Se o máximo da pena for superior a 8 anos, mas não passar de 12, prescreve em até 16 anos.
  • Máximo da pena superior a 4 anos e que não exceda 8, prescreve em 12.
  • Máximo da pena superior a 2 anos e que não exceda 4, prescreve em 8.
  • Máximo da pena igual a 1 ano ou superior que não exceda 2, prescreve em 4.
  • Quando a pena máxima for inferior a 1 ano, o crime prescreve em 3.
Para saber em que crime se enquadraria algum caso, o ideal é procurar por um advogado, que irá avaliar aquela conduta e poderá dizer se ainda é possível entrar com um processo contra o agressor.

A partir de quando começa a contar esse tempo?

Desde a aprovação da Lei Joanna Maranhão (que leva o nome da nadadora brasileira que denunciou abusos sexuais que sofria de seu treinador durante a infância), é possível que o prazo para a denúncia seja maior, uma vez que poderá ser contado a partir da maioridade da vítima. Mas nem sempre essa conta vai começar quando a criança completar 18 anos. Existem duas possibilidades diferentes que devem ser avaliadas para saber quando essa conta tem início.
Caso seja feita denúncia ainda durante a infância: se alguma queixa for feita ainda na época em que a criança foi abusada ou em qualquer período antes de ela atingir a maioridade, o prazo para prescrição do crime começa a contar a partir do fato acontecido.
Caso a denúncia só seja feita após a maioridade: sem nenhuma ocorrência aberta anteriormente, a conta dos anos para que o crime prescreva começa a partir de quando a vítima fizer 18 anos.

Como provar ser vítima anos após o crime?

Provar que sofreu um abuso quando criança é uma das maiores dificuldades. Isso porque, na maioria das vezes, não há testemunhas que tenham presenciado o ocorrido, além de não ser possível realizar nenhum tipo de exame físico, já que se passou tanto tempo.  “É muito difícil, mas é possível. Existe também um outro tipo de prova, que é a prova por indícios. Acontece se uma gama de pessoas presta queixa contra uma mesma pessoa, se tornando uma evidência de que o acusado pode mesmo ser culpado”, explica o advogado.

Como denunciar?

  • Caso deseje, o primeiro passo pode ser ligar para o Disque Direitos Humanos (ligue 100) para tirar qualquer dúvida e receber instruções de como agir. A pessoa que ligar poderá ser a própria vítima ou também alguém próximo que queira orientações.
  • Para esses casos antigos, o ideal mesmo é procurar por um advogado de confiança que poderá avaliar em qual caso se encaixa o crime cometido. Assim será possível saber em quanto tempo ele prescreve ou se já não há mais chances de denunciar.
  • Caso haja ainda tempo hábil para prestar queixa contra o agressor, procure pela Delegacia da Mulher mais próxima de você - a ONG Maria da Penha disponibiliza umalista de delegacias especializadas e pode ajudar. Lá, você receberá todas as instruções necessárias para abrir um Boletim de Ocorrência contra o agressor.
  • Feito isso, a polícia dará início às investigações, ouvindo todas as partes envolvidas e recolhendo todas as possíveis provas para montar um relatório ao Ministério Público.
  • Depois dessa investigação, o Ministério Público avalia se a queixa deve ir a juízo. Será observado se há provas suficientes para que o acusado seja julgado. Caso não haja, é possível que o relatório retorne à Polícia para que sejam colhidas novas provas.
  • Com o relatório aprovado pelo Ministério Público, ele segue para um juiz, que realizará uma audiência e determinará se o acusado é culpado ou não. 

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